Completa 62 anos nessa quinta-feira (21) a assinatura do Acordo do Campo em Pernambuco. De um lado, alguns latifundiários; do outro, milhares de trabalhadores rurais que desconheciam o que era o salário-mínimo criado duas décadas antes por Getúlio Vargas. À cabeceira da mesa, o então governador Miguel Arraes.

Aquele era um momento inédito de um processo de negociação dificílimo, envolto em tensão, violência e eventuais mortes, nas terras que um dia foram capitania hereditária. 

O acordo foi assinado em 21 de agosto de 1963, no gabinete do Palácio do Campo das Princesas de onde o governador despachava. E propunha relações trabalhistas menos desiguais entre canavieiros e donos de usinas.

Pela primeira vez, alguns direitos seriam estendidos a homens e mulheres que viviam do corte da cana-de-açúcar, descendentes de uma escravização secular e uma abolição que, em 1888, despejou à má sorte as pessoas escravizadas, para barrar qualquer possibilidade de reforma agrária. 

Basicamente, o Acordo do Campo garantia aos trabalhadores rurais um valor mínimo mensal pela força braçal e extenuantes horas por dia dedicadas ao canavial. Também permitia a organização em cooperativas e sindicatos para negociar com as usinas.

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Na prática, com algum dinheiro na mão, mesmo que pouco, os trabalhadores rurais poderiam romper a relação de exploração que os prendia ao barracão. Era o fim de trabalhar em troca de comida e ainda acabar o mês devendo ao dono do engenho. 

Também passou a ser realidade aos empobrecidos adquirir coisas simples, como colchão, sandália e, quem sabe, um radinho de pilha para, finalmente, adentrar no século 20.

Um ano antes da assinatura do Acordo do Campo, foi deflagrada a grande greve que mobilizou 200 mil trabalhadores rurais. Eram tempos de tensão, que exigiam mudanças na relação de trabalho no campo. 

Na política, no dia 7 de outubro de 1962, o advogado cearense Miguel Arraes derrotava nas urnas um representante direto da economia açucareira: João Cleofas.

Cleofas é derrotado em 1962

A disputa foi pegada. Menos de 15 mil sufrágios deram a vitória a Arraes. A diferença foi de 2,4% dos votos válidos. Arraes tinha sido eleito prefeito do Recife em 1959 e era uma liderança em ascensão. 

Como governador, além da assinatura do Acordo do Campo, medidas como a eletrificação das zonas rurais e o programa Chapéu de Palha, que concedeu auxílio financeiro aos trabalhadores rurais na entressafra da cana, fizeram de Arraes um político venerado em cidades da Zona da Mata e do Sertão do Pajeú.

Embora fosse visto pelos adversários como radical por conta dos seus posicionamentos, Arraes era um político que apostava na negociação. 

No contexto da radicalização ideológica da Guerra Fria, defendeu pacificação nacional por meio de um programa nacionalista e de políticas de correção das desigualdades sociais e regionais.

Arraes é deposto por militares, é o golpe de 64 na rua

Vale relembrar o material produzido pelo Diario de Pernambuco, que marcou os 50 anos do golpe.

Arraes só não negociou com os militares, na ocasião do golpe de 1964. Fizeram chegar ao governador de Pernambuco que, se ele aceitasse moderar seu jeito de fazer política, poderia continuar no cargo. Arraes não topou e acabou deposto no dia 1º de abril de 1964. Foi retirado do Palácio do Campo das Princesas para entrar para a história.