Na dinâmica dos laços de família que estruturam as relações de poder em Pernambuco, um personagem até então desconhecido do grande público ganhou evidência no noticiário político recentemente. Chama-se Waldemiro Ferreira Teixeira. Empresário, ele é primo da governadora Raquel Lyra (PSD), irmão da procuradora-geral do Estado Bianca Ferreira Teixeira e, agora, será pauta de uma Comissão Parlamentar de Inquérito que será instalada na Assembleia Legislativa nos próximos dias.

Na segunda-feira (4) que marcou o fim do recesso, uma edição extra do Diário Oficial publicou o pedido de criação de CPI para apurar o processo licitatório que definiu as quatro agências de publicidade para as contas do governo do estado. O contrato é de R$ 120 milhões/ano, podendo ser prorrogado por até dez anos.

O requerimento que defende a instalação da CPI é de autoria da deputada Dani Portela (PSOL) e surpreendeu o governo Raquel Lyra. Esperava-se que a reabertura dos trabalhos fosse marcada pelo debate em torno dos pedidos de empréstimos feitos pelo Estado.

A iniciativa de Dani Portela foi subscrita por um terço do conjunto de parlamentares, como exige o regimento interno da Casa. O presidente da Assembleia e deputados do PSB, PL e União Brasil garantiram 14 das 17 assinaturas de apoio.

Politicamente, para que uma Comissão Parlamentar de Inquérito seja criada, é preciso que haja um “fato determinado”. E o fato determinado, para os parlamentares que assinaram o pedido de CPI, envolve o primo da governadora.

Pertencem a ele as salas comerciais onde funciona uma das agências vencedoras, a E3 Comunicação. As quatro unidades ficam localizadas em uma das torres empresariais do RioMar Trade Center.  

Sócio da Makplan e de outras empresas

Waldemiro é um dos filhos do publicitário Marcelo Teixeira, que é tio materno da governadora. Pai e filho são sócios da Makplan Marketing e Planejamento. A empresa foi aberta em 1989. Recentemente, a agência teve rejeitado um recurso no Tribunal de Contas do Estado.    

Foto colorida do publicitário Marcelo Teixeira
Marcelo Teixeira, tio de Raquel e sócio dos filhos

No meio publicitário, Waldemiro Teixeira é conhecido pelo apelido “Dodi”. Além da Makplan, ele é proprietário de outras cinco empresas. Em duas delas, a Ciclop Investimentos e um posto de gasolina situado em Jaboatão dos Guararapes, repete a sociedade com o pai. Na Ciclop Investimentos, o irmão de Dodi, Breno Teixeira, também é sócio.

Contratos com entes do poder público

Além da área da comunicação, o primo da governadora é empresário também do setor de festas e eventos. Algumas de suas empresas já firmaram contrato com prefeituras. Ele consta como único proprietário da Fogo Comunicação, aberta em 1988. No Tome Conta, há registro de 17 empenhos estaduais em favor da empresa, entre 2009 e 2020, em nome do distrito de Fernando de Noronha e a Empetur. 

A empresa também já teve contratos com prefeituras de nove municípios pernambucanos. Foram eles: Camaragibe, Abreu e Lima, Vitória de Santo Antão, Capoeiras, Quipapá, Santa Maria do Cambucá, Escada, Santa Filomena e São Benedito do Sul.

Em 2013, montou a Ponto Sonoro Entretenimento, para atuar no setor de festas e eventos. De lá para cá, a empresa fechou contrato com prefeituras de nove municípios. Foram eles: Jaboatão dos Guararapes, Camaragibe, São Lourenço da Mata, Cabo de Santo Agostinho, Abreu e Lima, Tracunhaém, Vitória de Santo Antão, Gravatá e Arcoverde.

No Tome Conta, há o registro da emissão de dez empenhos do governo do estado à Ponto Sonoro referentes a 2013 e 2014, por meio da Fundarpe e Empetur. Os anos correspondem às gestões de Eduardo Campos e João Lyra Neto.

Outra empresa de Waldemiro Teixeira existe desde 2010 e é do ramo de tecnologia da informação. É possível localizar a emissão de um empenho de 2021 da prefeitura de Tamandaré, no litoral sul pernambucano. Tome Conta é o nome do portal que permite o acompanhamento da movimentação financeira e orçamentária de órgãos públicos. 

Cinco das empresas de Waldemiro Teixeira têm como sede o mesmo endereço: duas salas comerciais no bairro da Boa Vista, área central do Recife. Todos os dados citados nesta reportagem são de origem pública.

Um único vínculo público na vida

Com mais idade que a governadora, que tem 46 anos, Waldemiro Teixeira nunca disputou cargo eletivo. E só há registro de um vínculo público dele. Entre maio de 2019 e dezembro de 2020, foi contratado por “excepcional interesse público” para a coordenação de comunicação e imprensa da Prefeitura de Ouricuri, no Sertão pernambucano. Foram 19 meses no cargo.  

Para os deputados que subscreveram o pedido de CPI, a suspeita é de que Waldemiro Teixeira possa ser sócio-oculto da E3 Comunicação. Além da propriedade das salas onde a agência está instalada, a oposição a governadora apontou outro elemento: uma profissional que trabalhou por mais de uma década na Makplan em função de destaque agora está na agência que atende o Estado.

Antes de apresentar o pedido de CPI, Dani Portela fez a denúncia nas redes sociais. “O primo da governadora estaria supostamente envolvido com o contrato bilionário com o governo do Estado? Vamos dar um play para contar essa história, mas guarda esse nome: Waldemiro Teixeira, primo de Raquel Teixeira Lyra”.

O empresário, então, entrou com uma interpelação judicial contra a deputada. “A parlamentar, valendo-se de expressões dúbias e insinuações, faz crer que o interpelante seria sócio oculto de empresas que mantêm contrato com o Estado”.

Waldemiro deseja que Dani responda, “de maneira clara, objetiva e fundamentada”, se possui alguma evidência concreta de que ele seja sócio oculto da E3. O caso está no Tribunal de Justiça de Pernambuco. A relatora é a desembargadora Andréa Epaminondas Tenório de Brito.

Governo forma maioria e vai ao ataque: começou a CPI!

A movimentação dos últimos dias foi interpretada como declaração de guerra entre as partes. O Palácio do Campo das Princesas colocou o peso que tem para formar maioria na CPI. Nos bastidores, conseguiu trazer para junto o PL, legenda que havia dado duas assinaturas ao requerimento de Dani, isolando o deputado Alberto Feitosa. Pela configuração política desta terça-feira (12), o governo tem 5 das 9 cadeiras.

A segunda jogada dos aliados da governadora foi mirar na autora do requerimento de CPI, que será uma das integrantes do colegiado. Fizeram chegar ao Ministério Público de Contas denúncia de que o gabinete de Dani beneficiaria com recurso público empresa vinculada a familiares do seu marido, o advogado Jesualdo Campos.

Abaixo, reproduzo a íntegra do documento protocolado no MPC e o vídeo em que a deputada, da tribuna da Alepe, rebate a denúncia.